Adoecimento e as marcas no corpo simbólico
"O corpo inconsciente guarda o segredo de nossa história pessoal e também da história coletiva. E, algumas vezes, nosso corpo somatiza problemas que não são somente nossos (...)" (Leloup, 2015, p.73)
Cuidar do corpo é cuidar do Universo, cuidar do Universo (ambiente) é cuidar de nós mesmo; micro e macro se correlacionam. Neurose é um fixação em nó para onde as etapas da vida nos retornam constantemente. Na psicose, alguma coisa se quebrou. A doença é um bloqueio e interrupção de energia.
¥ Pés - consciência matricial
Memória que se remete a vida intrauterina. Período em que estamos completamente passivos a tudo que a mãe vive.
A aceitação e a compreensão de que podemos estar completamente passivos são meios de transformar uma vida que coxeia numa vida que dança. Os pés são o contato com as raízes e com a terra. O equilíbrio do psiquismo está relacionado co o enraizamento. Se a terra é adubada, as raízes são sadias e a árvore também.
¥ Tornozelo - Nascimento
O nascimento produz traumatismos e marcas deixadas em nosso corpo. É o momento de articulação entre a vida intrauterina e a extrauterina. Elo entre a vida fetal [fusão/ unidade] com o mundo exterior e a vida no tempo-espaço.
O tornozelo é a articulação basal na circulação de energia entre diferentes partes do corpo.
"Quando recusamos nosso destino, nosso código genético, o programa que está escrito em nosso genes e células, ao invés de evitarmos o destino, ativamos sua realização." (Leloup, 2015, p.42)
¥ Joelhos - Consciência oral
Após o nascimento o corpo do bebê entra em relação com um outro corpo. A relação do bebê com a mãe busca manter a unidade de até então. A consciência se concentra nas experiência da boca. Por meio da oralidade começa a percepção de mundo.
Sentados no colo de alguém, também, se está bem próximo aos seios. Os joelhos estão relacionados com a lembranças ligada a boca. Algumas memória entulham os joelhos e nos convoca a deixar partir o que não é verdadeiramente nosso - desapegar. Todas as relações entre pernas, joelhos e pés nos conectam com nossa mãe interna, com a terra e com o enraizamento na matéria externa - no mundo.
¥ Pernas, coxas, nádegas e genitália - Consciência anal
A criança perde a identidade com o corpo da mãe e descobre o próprio corpo. Neste período, a aprendizagem da auto limpeza é enfatizada.
Todas essas partes do corpo se unem ao sacro [local sagrado]. A abertura e fechamento das coxas é a parte de nós que atua o medo, a ansiedade, a confiança é a abertura. As coxas intermediam o joelhos e os genitais.
As pernas são os órgãos de marcha e de progresso social; o andar, fácil ou dificultoso, depende do contrapeso que temos que carregar.
O ânus está relacionado com a percepção de que tudo o que é composto será decomposto. As coisas são impermanentes. Antes de entrar no estágio de silêncio, há memórias da violência e de traumatismos por atravessar. É necessário abrir para dar e para poder receber, poder pegar. A retenção [constipar] relaciona-se com avareza, medo de faltar, medo de perder e desejo de guardar. Não deixar passar tudo nem reter tudo - caminho do meio.
O sexo é o momento de passagem para além do Ego/ Eu. Tocar um sexo é tocar uma história de medos e de desejos. Há o prazer que está ligado ao corpo e o prazer que está limitado ao corpo.
¥ Ventre e coluna vertebral - Consciência familiar
Momento de consciência da imagem que os pais têm sobre os filhos. Primeira convocação da vida para enfrentar a saída das expectativas que país é mães tiveram a respeito dos filhos. Busca pelos próprios projetos e diferenciação do que foi prospectado pelos pais.
Ter ventre é ter centro [hara]. Observar o ventre é observar o nosso mundo de emoções. Nossas dificuldades digestivas são uma interiorização dos problemas que podem existir entre nosso pai e nossa mãe.
Determinados acontecimentos nos causam mal ao ventre e nos provavam vômito, deixando explícita a relação do nosso corpo com o mundo. Há pressões que nos sufocam e provocam vontade de vomitar. Há algo a ser evacuado forte que as palavras, gritos, lágrimas não expressam e precisa ser externalizado no vomito.
Há momentos em que temos a sensação de ter recebido um soco no estômago. Todos nós temos coisas difíceis a digerir que nem sempre depende do estado de nossa cozinha mas sim de como foram ditas, de como escutamos, dos gestos, de certos abandonos e de certos olhares. Há determinados acontecimentos que levam tempo para ser digerido e nos empanturra. Temos que vomitar o que carregamos de muito pesado em nós.
O trato gastrointestinal tem função de processar, absorver e sintetizar o alimento para nutrir o corpo e eliminar substâncias nocivas.
O fígado está relacionado com humor. Melancolia [bile negra] provoca uma série de sintomas alérgicos, vômitos, icterícia, calafrios. Lugar do corpo onde habita o medo, a cólera e o ciúme. A recusa de ver com discernimento e clareza é uma recusa a retidão e bloqueio na tomada de decisão justa em situações pesadas. Uma visão biliosa do mundo é uma visão sombria. É impossível ir para a luz sem que tenhamos enfrentado as sombras que nos habitam.
O baço, assim como os rins, tem como função a filtração do desgosto de viver. O pâncreas faz o trabalho de transformação e de regulação [insulina] da fonte de energia do corpo [açúcar]. Todas as provações pelas quais passamos atingem o pâncreas, estimulando-o a disponibilizar energia para a efetivação do que nós propomos a realizar. Antes de poder evacuar, é preciso assimilar. O tempo de digestão é o tempo de assimilação.
Colocamos os pés e os rins em relação com a orelha pois são locais de escuta no interior de nós mesmos. Os rins escutam e filtram as mensagens [sangue] em nós mesmos. É local de filtragem e de purificação. São o espaço das palavras que temos a escutar.
Nessa parte do corpo recrutamos energia, pela vida que a habita, para tomar decisões e enfrentar os acontecimentos.
Os alimentos afetivos são tão importantes quanto os alimentos físicos. O que é ingerido é integrado a nós. Na jornada do herói ou heroína rumo à individuação perpassa a separação, a iniciação e o retorno. É preciso saber dizer sim àquilo que ele é, de agradável e de desagradável, como condição para ir mais longe.
"O homem se afirma à medida que se opõe" . (Hegel apud Leloup, 2015, p.47)
Ter um bom esqueleto é ter uma boa coluna e poder escutar o seu desejo mais íntimo sem medo de desagradar outras pessoas. Inspira-se pelas solicitações da vida. A presença e ausência de pai [lei/ palavra que nos estrutura] estão ligadas à presença ou ausência de coluna cerebral. É a estrutura interior, seu eixo e o eixo do mundo; o que nos mantém em pé em meio às provacoes. Ser pai é dar poder ao filho de adquirir meios de realização. Não permitimos ao outro um poder que nos faltou.
¥ Peito e coração - Consciência social
A capacidade de se relacionar profissionalmente, sexualmente e se integrar bem na sociedade.
Quem não aprende a elaborar as suas emoções negativas, sobrecarrega o coração e a circulação, correndo risco de sofrer ataque cardíaco ou acidente vascular. Coração é a sede dos sentimentos mais intensos [amor, compaixão]. Qualquer afecção física ou psíquica aumenta a atividade do sistema de bombeamento sanguíneo relacionado com coração. Quando o sangue entra em ebulição, ferve nas veias e a raiva não é expressada pela pessoa, a pressão arterial sobe. Em caso de raiva, aborrecimento, aflição e estresses a pressão se eleva extremamente. Quando permanentemente elevada, um distúrbio emocional se torna orgânico podendo colapsar o aparelho circulatório. A pressão arterial elevada pode estar relacionada com funções renais. Uma pressão desagradavelmente baixa manifesta-se a partir do cansaço, falta de ânimo, exaustão, indisposição, diminuição da concentração e do desempenho, humor depressivo, dentre outros.
¥ Ombros - Consciência autônoma
O fato de se estar adaptado a uma sociedade doente não é estar em boa saúde. A imagem social sintoniza com a consciência de si mesmo.
A posição dos ombros simboliza como nós afirmamos perante a sociedade. Na passagem do Eu para o Self (Graf Durckheim) os ombros se relaxam, o centro se desloca para o estômago, ventre e abdome [hara].
¥ Nuca e pescoço
O pescoço é elo entre cabeça e coração. Quando esse fluxo está interrompido angustiamos. Angústia significa fechar; estar angustiado é estar com a garganta fechada e a respiração bloqueada. Há palavras que permanecem pressas em nossa garganta, nos impedem de respirar e impede acesso ao coração. Quanto mais fugimos de um sentimento mais ele retorna. Passamos de uma vida submissa para uma vida escolhida.
A nuca rígida mostra o quanto estamos limitados. A inteligência deve permanecer flexível. É com a nuca que movemos a cabeça para baixo e para cima, para a esquerda e para a direita. A possibilidade de olhar amplo e perceber as diversas facetas e aspectos.
¥ Respiração
O controle da respiração ocorre no tronco encefálico [nuca]. A falta de oxigênio no cérebro, em poucos segundos, provoca tortura e turvações da consciência e quando prolongado provoca danos cerebrais permanentes. Falar é expiração com som: gemer, sussurrar, soluçar ou suspirar. Uma respiração lenta desacelera o batimento cardíaco, assim como uma respiração acelerada intensifica o batimento cardíaco.
Há momentos em que prendemos o ar para reprimir sentimentos pouco suportáveis e aumentar a tolerância em momentos de dor. A angústia e o estreitamento da liberdade são sentidos como estreitamento no peito. Sentimentos fortes influenciam no ritmo da respiração.
¥ Mãos
Tocar as mãos é firmar um contrato/ acordo. A imposição de mãos é ato de comunicar energia. Com a mão fazemos contato com o mundo.
¥ Cabeça, olhos, nariz, ouvidos e maxilares
A boca está relacionada com a fase oral. A mandíbula está relacionada com a fase anal [contração da mandíbula é similar à contracao das nádegas]. O nariz está relacionado com a sexualidade. As maçãs do rosto estão ligados ao ventre. Os olhos estão ligados com o coração [o que os olhos não veem, o coração não sente]. A testa está relacionada com estado mental e pensamento. As orelhas estão relacionadas diretamente com a escuta sensível da palavra e do silêncio.
Consciência do Self - momento de afirmação do eu autônomo e em há um relativa segurança de que as crise são transitórias. Nos diferenciamos da massa social.
Consciência Teoantrópica - estado de consciência que transcende desejos e medos.
"Quando você toca alguém, nunca toque só um corpo. Neste corpo está toda a memória sua existência" (Graf Durckheim)
Fontes:
Leloup, Jean-Yves. O Corpo e seus Símbolos. Petrópolis: Vozes, 2015.
Morschitzky, Hans; Sator, Sigrid. Quando a alma fala através do corpo: compreender e curar distúrbios somáticos. Petrópolis: Vozes, 2013.
Kerinheder, Albert. Conversando com a doença. Um diálogo de corpo e alma. São Paulo, Summus Editorial, 1993